Meus dias em Goiânia estão chegando ao fim. Escrevi, reescrevi e
trescrevi esse mesmo lero ao longo das ultimas semanas. Exaustivamente,
reproduzo cenas, abraços, despedidas, imagens, frases, sons, impressões que
dizem mais do passado que do futuro-provável. A única história que me interessa
é a minha em Goiânia. Em minha cabeça só há espaço para o turbilhão que essa
cidade foi e o que ela será para mim depois de minha partida. Que as coisas
continuam com ou sem nossa presença, que as pessoas seguem adiante e as paisagens
e os carros, é o óbvio e será sempre assim. O importante é como o passado nos
possui, ainda de sua distancia.
Prestes a deixar a prisão, penso-a como nunca dantes. Alcatraz é Goiânia. Não possuo estômago, nem disposição para correr atrás de outro assunto. É assim na vida, é assim na escrita. O que significa que dando no pé ou não é sobre isso que escreverei... fatidicamente. É incrível que durante dois anos e meio acoplado aos arranha-céus GYNianos e à noite pura e selvagem e às pessoas... eu tenha escrito, essencialmente, pouquíssimas páginas sobre o que se passou comigo aqui. Comigo fumado da cabeça aos pés. Comigo com o bolso cheio. Comigo repleto de impressões. Comigo ao lado de Ana. Comigo estorricado de sol. Comigo paranoico. Comigo fodido e mal pago... Meu olhar estava sempre voltado para a ficção, para o passado (em breve, lá estará minha exuberante e caustica Goiânia), para o que, então, eu considerava inalienável.
Sinceramente, me pergunto: com o que me preocupo mais: A vida ou a escrita? Viver para escrever, como disse o outro? Escrever para continuar de pé, atento, desengonçadamente preparado? Viver para que, uma vez escravo da vida, ela forneça ao escritor material verdadeiro e autêntico? Escrever para que a vida não se amofine como um vira-lata cansado de comer do lixo? Penso que é impossível separar uma da outra, lalalá. Mas são duas coisas distintas, por mais que tentemos juntá-las como irmãs siamesas que comem do mesmo prato.
A vida, quando passada aqui no papel, quase nunca é insuportável. Os
acontecimentos adquirem novos ritmos, as sombras ganham corpo, os
olhos alcançam o que raramente percebemos quando em ação. Ao passo que
Ao Vivo, só para manjar Belchior, é muito pior. Sofrimento e felicidade
andam de mãos dadas, o mesmo instinto impulsivo trabalhando sobre os homens...
Amando-os, fodendo-os indiscriminadamente, arquitetando-os insustentáveis, para
que um dia acabem todos vítimas do mesmo carrasco. E nada é uma questão de
sorte... nada.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirÉ, meu amigo, ler essas linhas logo cedo só me faz lembrar de dois poetas, o Drummond com o seu "Lutar com as palavras/ é a luta mais vã/ entanto lutamos/ mal rompe a manhã", e Pessoa com o seu: "Enquanto o destino mo conceder, continuarei fumando."
ResponderExcluirNo segundo verso eu substituo o fumar por essa necessidade esquisita que temos, nós, os natural born writers (dominados desde a conscientização de si por um incontrolável cacoethes scribendi), de escrever o que quer que ajude a tornar o peso da existência mais suportável.
Gosto muito!
ResponderExcluirDe volta a Natal?
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